terça-feira, 24 de maio de 2011

"tudo"

Tudo cura o tempo, tudo faz esquecer, tudo gasta, tudo digere, tudo acaba. Atreve-se o tempo a colunas de mármore, quanto mais a corações de cera! São as afeições como as vidas, que não há mais certo sinal de haverem de durar pouco, que terem durado muito. São como as linhas, que partem do centro da circunferência, que quanto mais continuadas, tanto menos unidas. Por isso os Antigos sabiamente pintaram o amor menino; porque não há amor tão robusto que chegue a ser velho. De todos os instrumentos que lhe armou a natureza, o desarma o tempo. Afrouxa-lhe o arco, com que já não atira; embota-lhe as setas, com que já não fere; abre-lhe os olhos, com que vê o que não via, e foge. A razão natural de toda essa diferença, é porque o tempo tira a novidade das coisas, descobre-lhe os defeitos, enfastia-lhe o gosto e bastam serem usadas para não serem as mesmas. Gasta-se o ferro com o uso, quanto mais o amor! O mesmo amar é causa de não amar, e o ter amado muito, de amar menos.

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